Esta semana o Estado teve outra enorme vitória sobre o crime organizado.
77 pessoas suspeitas de estarem ligadas ao crime organizado foram presas numa enorme operação policial. Acalmem-se, leitores. Foi em Nova Iorque e em Palermo, que a Mafia siciliana levou um duro golpe, designadamente com a prisão do presumível sucessor de Bernardo Provenzano, preso há três anos. Especialmente atingida foi a tenebrosa família Gambino. Não foi cá. Cá vigora uma lei mafiosa, sim, mas é a do silêncio. Salvo excepções. As excepções, claro, é que acabarão por ter de responder em tribunal.
«Temos de ser uma máfia no bom sentido e ajudar-nos sempre uns aos outros». A frase é de ... quem havia de ser? Alberto João Jardim. Ser um criminoso no bom sentido. Eis uma noção que me transcende: o bom sentido do crime. Esta ideia de haver um lado bom, solidário, honroso, na Mafia remonta aos primórdios da defesa pública dos mafiosos desde a década de 70 do século XIX na Sicília. Contra esta ideia benigna da Mafia têm combatido cidadãos, polícias, magistrados, tribunais e, alguns, poucos, políticos ao longo dos séculos. É bom saber quem, em Portugal, se põe do lado de quem. Seria de bradar aos céus, senão fosse brincar com o fogo.

(
O Zapping também o leu)
"... entretanto a opinião pública já se tinha aborrecido e tornado céptica. Quase quatro anos haviam passado sobre as fantásticas revelações de LeopoldoNotarbartolo em Milão. O processo desencadeara no início um enorme debate público sobre a mafia. Foram publicados alguns relatos preciosos, incluindo dois de polícias sicilianos. No entanto, por cada estudo útil da famosa organização criminosa, surgiam dois ou três que ajudavam a confundir a questão."
Um dos livros que me decidi a ler nestas férias foi este. Em Portugal foi publicado pelas
Edições 70 e para quem quiser saber tudo o que é possível saber sobre a Mafia siciliana a leitura é obrigatória. Desde os primórdios, à sombra da produção de citrinos nos arredores de Palermo, em meados do século XIX, até às confissões históricas de Buscetta e ao homicídio de Falcone, passando pelo
boom da construção civil em Palermo, a exportação do modelo para a América do início do século XX, pelas perseguições do fascismo italiano e pela contaminação da Democracia Cristã italiana.
Descontadas as devidas proporções, fui-me apercebendo como em Portugal, por certos episódios ocorridos nos mais variados sectores da vida nacional, é possível detectar comportamentos e técnicas em que a Cosa Nostra foi pioneira. No futebol, através da desacreditação de testemunhas. Na política através da invocação da honorabilitá de suspeitos de corrupção, na indústria da noite através de sangrentos ajustes de contas à americana, muito mais que à corleonese.
Falta-nos é Falcone.