"A Polícia Judiciária abdicou de provar que Leandro violou a pequena Joana, antes de a enteada de oito anos desaparecer da aldeia da Figueira, em 2004. Por forma a "poupar 10 mil euros" em exames nos Estados Unidos, diz ao CM Gonçalo Amaral, ex-coordenador da PJ de Portimão." , leio no Correio da Manhã.
Gostava francamente de saber se na investigação do desaparecimento de Madeleine McCann a Polícia Judiciária deixou de efectuar diligências para poupar dinheiro. Ou, pelo contrário, se gastou o que foi preciso. É que parece, parece, que para o Estado existem desaparecidos de primeira e desaparecidos de segunda.
Este caso fica para a história sob muitos pontos de vista: a relação entre a diplomacia e a investigação criminal, o tratamento desigual que a Justiça confere aos cidadãos nas mesmas circunstâncias, as perversidades dos processos mediáticos, mas sobretudo, será um caso de estudo de como a Justiça pode cair na vertigem de fazer mal a si própria. Com o processo da Casa Pia todos pensámos que se tinha aprendido alguma coisa. O desfecho deste caso garante-nos que, afinal, não se aprendeu nada e cometeram-se exactamente os mesmos erros. Uma tristeza.
"Uma solução"? Eu pensava que do Ministério Público se deviam esperar decisões de arquivamento ou de acusação e não soluções. Estranha linguagem esta do Procurador-Geral da República. Estou curioso, muito curioso. Má sorte ter lido o Código de Processo Penal.
"A Polícia Judiciária continua à disposição do Ministério Público para desenvolver as diligências de investigação que este entender por pertinentes e essa disponibilidade só cessa quando o inquérito terminar por despacho do MP", afirmou Pedro do Carmo, Director Nacional Adjunto da PJ sobre o "caso Maddie". Era preciso dizer? Não é sempre assim? Ele há coisas que me transcendem.
Eu não disse que o Governo iria desvalorizar? Não, senhor ministro, não é uma situação catastrófica. É só terceiro-mundista. O Governo, dada a independência das magistraturas, tem pouco que fazer na área da Justiça. Uma das coisas essenciais num Estado digno desse nome é a segurança nos tribunais. O Governo tem apenas a estrita obrigação de a assegurar. Não assegura. O que nós queremos saber é o que vai fazer na prática para que os tribunais sejam lugares seguros. Sob todos os pontos de vista. Da integridade física das pessoas à integridade dos edifícios, já agora (mas isto daria para outra conversa) dos processos que lhes estão confiados.
Pelo menos 16 tribunais em todo o país registaram casos recentes de violência, segundo dados da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP). Depois de ter acordado para a realidade da violência escolar, o país apresta-se a acordar, devagarinho, é certo, que está muito calor, para a violência judiciária. O Governo, deixem-me adivinhar, dirá que são casos isolados que não retractam a realidade. Desvalorizará, como fez com o inenarrável episódio da Sta. Maria da Feira. Aos juízes apenas apelo que não deixem de julgar. Ao poder político digo que se continuam a assobiar para o lado ainda se tramam.
Nunca discorri publicamente sobre o “caso Maddie”. Por várias razões, a principal das quais a de prudência mínima. Sabendo pouco, sei o suficiente para ter a noção que não há jogo menos aconselhável e mais perigoso do que tirar conclusões sobre processos que não se conhecem. Este é um dos mais deprimentes desportos nacionais, que tem tido continuidade noutros casos, como o “caso Esmeralda”. Todos julgam, todos condenam, todos sabem com a superioridade da opinião o que é e o que não é. Todos manipulam até ao limite do insuportável. A cara de mau ou de bom, a sisudez ou o sorriso de orelha a orelha, as lágrimas ou a sua ausência, deixaram de ser uma naturalidade para passar a ser prova de culpa ou de inocência. Numa palavra: um nojo.
Não é hoje que vou quebrar a regra. Não sei nada sobre o processo nem sobre a verdade. Vou é falar da Justiça e por favor retirem as legendas com os nomes do caso. Um ano. Um ano com um inquérito aberto sem resultados, mas com arguidos, sem provas, mas com livros, sem fim à vista, mas com uma brigada de polícia. Pai e mãe de uma criança são arguidos. Isto é, suspeitos. De quê? Nem a polícia sabe. Ninguém sabe nada. E não acontece nada. Num país decente, uma coisa aconteceria: o inquérito seria arquivado. Só cá as autoridades de investigação criminal acham normal, perante a indiferença cívica e judiciária geral, que um cidadão seja arguido, isto é, suspeito, para a eternidade. Um ano. De nada e de coisa nenhuma. Desculpem, falso: um ano de directos televisivos, de debates de horas a fio sobre Maddie, de manchetes sobre Maddie, de diários de Maddie, de fotos de Maddie, de repetições até à náusea comunicacional das mesmas fotos, das mesmas manchetes, dos mesmos debates. Mas nada. Mais nada.
(Publicado na edição de hoje do Democracia Liberal)
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