Mudaram duas coisas substanciais no regime em vigor até ontem na viagens dos deputados. Os deputados deixam de poder viajar em primeira classe e passam a viajar apenas em executiva. E deixam de poder desdobrar bilhetes, ou seja, trocar o seu lugar em primeira classe por dois lugares em executiva, de modo a viajarem acompanhados. Alterações promovidas por Jaime Gama, a segunda figura do Estado. Os rumores de candidatura presidencial pelo PS contra Cavaco Silva e algumas alterações cirúrgicas mas oportunas no funcionamento parlamentar de quem o país tanto descrê, vem dar razão a Soares: peixe de águas profundas.
(Dubolta)
O Governo apresentou o seu programa ao país na Assembleia da República. Aparentemente haveria tanto para dizer. Um programa, que diabo, de Governo, safa! Para quatro anos, caramba... e, todavia, nada. Um desfile de marretas cheio de lugares comuns, que ouvimos desde que foi inaugurado o troço Lisboa-Carregado do caminho de ferro para levar a Rainha a Vila Nova da Rainha, gozar as suas merecidas de férias de Verão, depois das agruras invernosas que inundaram o Passeio Público."As pensões até 630 euros vão ser aumentadas 1,25 por cento e as pensões até 1500 euros sofrerão um aumento de 1 por cento.". Despejam-se mais milhões sobre a economia. Aperfeiçoar aqui, tentar articular ali. Eis as notícias de um dia de trabalho no novo Público alinhado. O mais, é impossível, porque as oposições não deixam. Who cares?
Amanhã é discutido e quase de certeza não votado o programa do Governo empossado por Cavaco Silva depois das eleições de 27 de Setembro (mais de um mês depois!...). A minha dúvida é só a de saber qual é o Governo cujo programa vai ser discutido. Mau começo, portanto, para um discussão democrática.
O CDS queria ocupar a Presidencia da Comissão Parlamentar de Educação da Assembleia da República. Seria a nova versão dos glutões do detergente pedagógico da inanidade. O partido que pôs o pessoal no Governo Santana Lopes a poder passar o ano sem o aproveitamento exigido pelas normas gerais e abstractas durante o ensino básico, queria presidir ao desastre.
Eu gosto de gentes decididas. Despachadas. João de Deus Pinheiro, esse fulminante raio de renovação política que Manuela Ferreira Leite colocou em Braga na lista de deputados, foi eleito e logo no primeiro dia, no da posse, pirou-se a grande estilo da vetusta parlamentada. Na Assembleia, bem sei, têm-se feito muitas benfeitorias. Edifícios novos, hemiciclo novo, creche para herdeiros dos deputantes, portáteis para twiitar, votações electrónicas, quadros falantes, guichets de formação em integração para debutantes, audiovisuais último grito e sei lá mais que simplex's e planos techno. Apenas se esqueceram de instalar um campo de golfe ali no vão dos jardins traseiros do palácio. E é assim que se transforma um representante eleito da Nação num deputado-meia-horinha para não desperdiçar greens.
Uma das vantagens de ter tempo para ver televisão é a de medir a cultura política e geral do jornalismo que se vai fazendo. Ontem, por exemplo, uma simpática mas anónima voz-off da RTPN anunciava que uma das novidades do Bloco de Esquerda nesta nova legislatura era apresentar um novo líder parlamentar, José Manuel Pureza, que nunca sequer tinha sido deputado. Pois é: informe-se a simpática e anónima voz off que já havia formas de vida inteligente na Terra antes do Bloco. A mim, aconteceu-me o mesmo em 1995, quando existia PP.
O braço de ferro de Sócrates contra Cavaco Silva no Estatuto dos Açores acabou. O Estatuto é inconstitucional. Sócrates soma e segue nas derrotas políticas. Uma verdadeira máquina. Mas a declaração do Tribunal Constitucional também devia fazer corar todos quantos, no Parlamento foram aprovando, com ou sem cambalhotas, este absurdo legislativo. Carlos César também aproveita para meter a viola no saco.
É um clássico de Verão: no final de cada sessão legislativa, sobretudo no final das legislaturas, a Assembleia da República quer despachar serviço a todo o custo e empreende maratonas parlamentares de votações. Sejamos francos: quando querem, os deputados são lestos a legislar e até, a atropelar normas regimentais com a pressa, como ainda há bem pouco tempo se viu com a famigerada lei de financiamento dos partidos, que jaz, justamente vetada por Cavaco Silva, nas catacumbas dos dias maus do Parlamento. Infelizmente, o sentido de urgência parlamentar fica-se normalmente por casos esporádicos.
Esta lufa-lufa é desprestigiante para a instituição parlamentar. Sobretudo, como é actualmente o caso, quando existe uma maioria parlamentar que tem nas mãos a batuta do ritmo de produção legislativa. Dá má imagem e pode gerar um cortejo de vetos do Presidente da República, que assim fica com as suas férias estragadas, tantos são os diplomas para analisar política e juridicamente. Isto para já não falar da suspeita sobre a qualidade técnica das leis que vão ser aprovadas à pressa, assim como que para despachar serviço.
Numa legislatura marcada por vários e maus exemplos de leis mal feitas, mais avisados andariam os deputados se se poupassem a maratona. Sobretudo, estando em causa cerca de um terço das propostas de lei apresentadas pelo Governo, o qual dispôs de uma confortável maioria parlamentar de apoio ao longo de quatro anos e meio. É, de facto, difícil de entender como se pode chegar a este ponto de inépcia política.
Em maioria relativa ainda se poderia justificar esta situação, com as sempre complexas negociações necessárias à aprovação das leis. Foi assim, por exemplo, a minha experiência parlamentar entre 1995 e 1999. Não foi o caso. À tradicional inércia parlamentar, ao tradicional desfasamento entre o tempo parlamentar e o tempo real, à tradicional necessidade de respeitar liturgias próprias e nem sempre negativas, juntou-se, é preciso dizê-lo, com todas as letras, a incompetência política da maioria socialista.
Nesta legislatura, cumpre reconhecer, melhorou a qualidade da fiscalização parlamentar da actividade governativa. Mas deram-se muitos passos atrás na qualidade do exercício do poder legislativo, afinal de contas, por onde começou a vida parlamentar…
(publicado na edição de hoje do Diário de Notícias)
Tornou-se moda ser ouvido em inquérito parlamentar e não falar invocando o segredo de justiça ou um mero "não me lembro" e depois ir lá outra vez já sem segredo, vá lá saber-se porquê, ou com a memória subitamente avivada. E ninguém acha estranho.
Os partidos políticos do sistema, os que têm o poder de legislar e decidir, ou seja, os partidos, todos, com assento parlamentar permitem-se tudo e julgam que tudo lhes é permitido, tal é a convicção de impunidade que têm. Há muito pouco tempo permitiram-se aumentar, em plena crise, as subvenções estatais para o seu próprio financiamento. Fizeram exactamente aquilo que hoje criticam aos banqueiros… Em plena crise. Num momento em que o desemprego dispara, as empresas fecham e a economia não está de tanga, mas sim de pantanas! Pelo meio passaram para um milhão de euros o montante de contribuições em dinheiro permitidas por lei.
Esta lei suscitou justa indignação.
Agora, em vez de reconhecerem a injustiça e o erro, o que fizeram os mesmos partidos, todos os que têm assento na Assembleia da República? Voltaram atrás? Corrigiram? Não. Dezasseis deputados de todos os partidos aprovaram por unanimidade uma nova regra na lei do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais durante a redacção final do diploma. Alteraram a norma que regulará os excedentes, os lucros, que advierem das campanhas eleitorais.
O lucro das campanhas eleitorais, que não podia acontecer na versão da lei ainda em vigor, já que a lei prevê (ainda) que os valores obtidos em acções de angariação de fundos são deduzidos à subvenção do Estado. Tal deixou de acontecer na nova redacção, abrindo as portas para que possam existir lucros (!) nas campanhas eleitorais.
Foi para determinar o que fazer com estas mais-valias eleitorais que os deputados da Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, conhecida também por 1ª Comissão, alteraram completamente a norma que previa a distribuição pelos outros partidos do excedente das campanhas eleitorais. Uma vez aberta a porta ao lucro, determinaram agora que tal montante reverterá a favor dos partidos quando as candidaturas sejam partidárias, para que sejam utilizadas em futuras campanhas. No caso das candidaturas independentes ou pessoais, caso das eleições presidenciais, o lucro reverterá a favor do Estado. “Tem de se garantir que não haja um enriquecimento de cidadãos ou movimentos por via de uma candidatura”, justificou-se o democrata deputado comunista Bernardino Soares, depois do inevitável social-democrata Guilherme Silva ter exposto a proposta.
E fizeram-no onde? Fizeram-no em Comissão, na fase de redacção final da Lei, que segundo o Regimento da Assembleia da República só serve para aperfeiçoamentos, não podendo alterar o pensamento legislativo.
Para fazer uma alteração de conteúdo em sede de redacção final, o presidente da Comissão, o oportuno socialista Osvaldo Castro, fundamentou-a na norma do regimento, o artigo 156º, nº2, que não impede o aperfeiçoamento do texto desde que não haja votos contra. Esqueceu-se o preclaro deputado que a mesma norma diz também que não se pode modificar o pensamento legislativo, que foi justamente o que a unanimidade parlamentar, mais uma vez a unanimidade parlamentar, acabou por fazer.
“Estamos a ir além da redacção final”, confessou o inocente e ingénuo deputado o socialista Ricardo Rodrigues, argumentando, no entanto, que a alteração “corresponde ao pensamento do legislador”. “Não se modifica o pensamento mas aperfeiçoa-o, é isso?”, questionou Osvaldo Castro. Todos concordaram. Para o golpe regimental ser perfeito, o presidente da Comissão ainda mandou chamar um deputado do CDS-PP, olha quem!..., único partido ausente naquele momento, mas também este concordou, obviamente (sempre que se trata de dinheiro o CDS apoia) com o teor da alteração e a sua fundamentação.
Esta violação do Regimento por todos os partidos significa que, além de legislar em despropositado proveito próprio, os mesmos partidos atingiram o patamar do livre arbítrio, violando despudorada e vergonhosmente as normas quando lhes convém. E o livre arbítrio é a negação do Estado de Direito e da democracia.
(publicado na edição de hoje do Semanário)
O nosso Parlamento não cessa de nos surpreender. Agora parece que passou um tempão a discutir se a palavra sexo deve ser substituída pela palavra género. Será que já não se pode dizer sexo masculino e sexo feminino? E como chamarão no futuro a quem continuar a insistir nessa diferença de natureza chamada sexo? Génerofóbicos? E depois queixam-se da falta de respeito pelo Parlamento...
Regimento da Assembleia da República:
Artigo 156.º
Redacção final
1 - A redacção final dos projectos e propostas de lei aprovados incumbe à comissão parlamentar competente.
2 - A comissão parlamentar não pode modificar o pensamento legislativo, devendo limitar-se a aperfeiçoar a sistematização do texto e o seu estilo, mediante deliberação sem votos contra.
3 - A redacção final efectua-se no prazo que a Assembleia ou o Presidente estabeleçam ou, na falta de fixação, no prazo de cinco dias.
4 - Concluída a elaboração do texto, este é publicado no Diário.
Dezasseis deputados de todos os partidos aprovaram por unanimidade uma nova regra na lei do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais durante a redacção final do diploma, o que regimentalmente não podem, depois do diploma ter sido aprovado em plenário parlamentar.
O que nasce torto, tarde ou nunca se endireita. Depois da lei do dinheiro vivo, os partidos do sistema, todos, unem-se para violar o Regimento da Assembleia da República? A ser verdade, é caso para dizer que "isto" bateu no fundo.
1º O regresso de Dias Loureiro à Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o BPN, para esclarecer as falsidades em que foi apanhado pela investigação jornalística depois de ter lá ido a primeira vez e onde tem sido nada surpreendentemente poupado pelo CDS, que só tem olhinhos para Vítor Constâncio.
2º O partido de Manuel Alegre que no último mês apenas teve um tema de crítica social: o problema das roupinhas da Loja do Cidadão de Faro.
O PS absoluto legisla a seu bel-prazer. Tecnicamente, legisla mal. Nem quando corrige, às vezes, acerta. É lembrar as sucessivas rectificações feitas ao Código de Processo Penal, é lembrar a vergonha das alterações ao Código do Trabalho, é ver as alterações ao Código Civil em matéria de divórcio. O PS não legisla: apenas dá pontapés ao Direito.
Hoje é inaugurado o hemiciclo novo da Assembleia da República. Cheio de vanguardas tecnológicas. Ou muito me engano ou haverá muito mais notícias do hemiciclo nos próximos tempos.
O PS quer limitar a circulação de jornalistas na Assembleia da República. Volta, Pacheco Pereira, estás perdoado! Senhores do Governo: e que tal inventarem um chipzito também para os jornalistas?...
Porque a Assembleia da República “não é um estúdio de televisão” e existe receio sobre a utilização que os deputados podem dar aos novos meios audiovisuais em plenário, a conferência de líderes decidiu ontem impor algumas regras e limites prévios ao uso do novíssimo sistema de projecção digital, até agora apresentado como uma das "coqueluches" da renovada Sala das Sessões. O Parlamento faz melhor ideia de si próprio do que aquela que os portugueses fazem dele. Esta medida de desconfiança face aos deputados também mostra que o Parlamento tem mais medo de si próprio do que devia. É um medo para lamentar. Já agora poderia a conferência de líderes explicar qual o seu conceito de campanha negativa? Será coincidente com o conceito de campanha negra de José Sócrates?
Em quatro anos certos houve 244 substituições de deputados para um total de 230 assentos. Quem quiser falar do descrédito da instituição parlamentar não precisa de José Eduardo Martins para nada.
Foi ontem publicada em Diário da República a Resolução da Assembleia da República nº 3/2009, que recomenda ao Governo que elabore um plano nacional de promoção da bicicleta e outros modos (meios não soaria melhor?...) de transporte suave. Nessa Resolução pode ler-se esta pérola: "este plano dirige-se a entidades públicas e privadas, associações, bem como ao cidadão individual...". Ora aqui está um dos muitos exemplos de normas mal redigidas por quem devia dar o exemplo. "Cidadãos individuais"? Será que para os preclaros legisladores parlamentares existem cidadãos colectivos? Tanto quanto me lembro existe uma fase do processo legislativo parlamentar que é a redacção final, em que é suposto tratarem-se destes erros, antes das normas seguirem para publicação. Ou será que os senhores deputados precisam de umas liçõezitas de português?
Portugal vai ter um novo Orçamento. Sim, isto não é nem uma rectificação, nem um suplemento, como tem sido qualificado pela semântica da crise. É um novo Orçamento, que envergonha o Governo que propôs, o Parlamento que aprovou e o Presidente que promulgou o primeiro Orçamento, que todos, todos, sabiam ser uma mentira, uma falsidade e uma mistificação. E depois queixam-se da (falta de) credibilidade das instituições. Outra trapalhada do Governo Sócrates que, se tivesse acontecido a outros era razão para crise nacional, demissão do Governo e antecipação de eleições.
O PSD decidiu repetir o jogo que tinha perdido por falta de comparencia. Desta vez, com quase todos os jogadores em campo nos dois lados, o resultado repetiu-se. Pois é. Há gestos, por muito bem intencionados que sejam, como por exemplo tentar reparar um mal, não correm tão bem como se se cumprisse o dever sempre que se exige que o dever seja cumprido. Pior a emenda que o soneto, como diz o povo.
Em Portugal ninguém respeita o Parlamento, que se chama constitucionalmente Assembleia da República. E por que é que ninguém o respeita? Ninguém o respeita porque o Parlamento não se dá ao respeito. Melhor: não se tem dado ao respeito ao longo dos anos da democracia. Consequentemente, ninguém o toma a sério.
Um Parlamento é uma instituição essencial numa Democracia. Num sistema parlamentar como motor, centro e dínamo do sistema. Num sistema presidencial como contraponto fiscalizador do Presidente.
Ora, esta semana ficámos a saber que várias instituições recusaram entregar documentos a uma Comissão de Inquérito Parlamentar. Esta atitude, tipificada na lei como crime de desobediência qualificada, é recorrente. Já aconteceu noutros inquéritos. E porquê? Lá está: ninguém acha importante e ninguém receia consequência desta ilegalidade. E com razão.
No e com o Parlamento nunca acontece nada.
Já provei do veneno do sistema nos inquéritos parlamentares. Deparei-me com recusas de dezasseis-entidades-dezasseis em entregar documentos, deparei-me com documentos desaparecidos de arquivos parlamentares, com boicotes, com pressões, com pactos de bloco central no encobrimento de situações irregulares e até com violação das regras legais de substituição de deputados nas Comissões Parlamentares de Inquérito. Eu denunciei.
O Ministério Público arquivou e no e com o Parlamento nunca acontece nada. Responsabilidade de quem? Dos deputados.
(publicado na edição e hoje do Democracia Liberal)
Ouvi hoje Maria de Belém Roseira, que preside à Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a nacionalização do BPN acusar várias entidades de recusar fornecer à Comissão diversos documentos, com o Banco de Portugal à cabeça. Sei muito bem o que é isso. Também me aconteceu. Maria de Belém avançou a hipótese de recorrer aos tribunais. Lembro que de acordo com a lei a recusa ilegítima é crime de desobediência qualificada. Eu, por mim, decidi cumprir o meu dever e fiz a respectiva participação ao Ministério Público, a qual foi oportunamente arquivada. Pode ser que agora, que os tempos são os outros e esta Comissão de Inquérito tem pelos vistos Presidente, coisa que a minha só formalmente tinha, a coisa acabe de outra maneira.
Com o Estatuto dos Açores Cavaco Silva quis dar um passo maior que a perna. Substantivamente o Presidente da República tem razão. Os partidos, todos, a começar pelo PSD, portaram-se vergonhosamente. Aprovaram e reaprovaram uma lei ordinária na forma e no conteúdo. Fizeram uma revisão inconstitucional da Constituição. Desafiaram o Presidente, o qual sabe os poderes que tem e os seus limites. Sócrates gostou do desafio e decidiu testar Cavaco Silva. A corda finalmente partiu. Cavaco perdeu a batalha.
Pouco interessa zurzir mais e mais num Parlamento que é capaz de fazer uma lei destas. Infelizmente, não é coisa que surpreenda no meio da mediocridade geral.
Politicamente, a questão foi mal gerida desde o início por Belém. Desde o tabu do Verão até à comunicação ao país desta semana, custa a crer como o Presidente da República se deixou enredar de tal forma nos seus gestos que só podia sair a perder. Cavaco devia ter saído como vítima, mas saiu como perdedor.
É que, tendo razão substantiva, a importância da questão nunca justificou a utilização da bomba atómica presidencial, ou sejam, a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições legislativas antecipadas, que de resto só beneficiariam José Sócrates.
O epílogo da questão esteve à altura dos episódios anteriores. Cavaco Silva quis usar a dureza semântica máxima para tirar a consequência política mínima. Porque das duas uma: ou está em causa, como disse o Presidente, o normal funcionamento das instituições democráticas e nesse caso o Presidente, que jurou cumprir a Constituição tem de dissolver a Assembleia da República e convocar eleições. Ou então, se não faz isso é porque não está em causa o normal funcionamento das instituições e o Presidente não podia ter usado levianamente a expressão.
Assim, Cavaco Silva deu poderoso contributo a uma ainda maior parlamentarização do regime, justamente, digo eu, ao contrário do que o regime necessita.
Nada ficará como dantes entre Belém e S. Bento e Sócrates engana-se redondamente se julga que o filme terminou. Oportunidades para o Presidente exibir os poucos poderes que tem não faltam. Pretextos políticos dados por um Governo fortíssimo em trapalhadas também não hão-de faltar. O problema é o país. Neste momento de crise aguda, que aliás vai piorar em 2009, tudo o que não faz falta é que depois da cooperação estratégica suceda a guerrilha estratégica.
(publicado na edição de hoje do Semanário)
(Foto)
Depois de muitos anos, consegui ver hoje integralmente um debate mensal com o Primeiro-Ministro. Eu, que me lembro de muitos debates com o outro Primeiro-Ministro do PS, tirei a dúvida: António Guterres é muito melhor em debate parlamentar do que José Sócrates. Este limita-se a repetir frases feitas pela milésima vez, como a de que o Governo meteu (será possível passar a dizer pôs, colocou em vez do horrível meteu?...) as contas públicas em ordem. Não responde às perguntas dos deputados. Ri-se das observações dos deputados da oposição, numa postura de irritante falta de respeito democrático pelos pontos de vista alheios (quererá Sócrates que concordemos todos à força com ele?...). No debate de hoje, Paulo Rangel e Jerónimo de Sousa tiveram excelentes prestações. Nada mais a assinalar.
Quanto mais votam mais se enterram. Continua bizarro o processo político-parlamentar de desvetização do Estatuto dos Açores. As regras de votação até a meio do processo mudam. O PS está destravado de todo. Um triste espectáculo, mais um, da instituição parlamentar.
A comissão eventual de inquérito ao caso BPN, que hoje tomou posse, vai ter 90 dias para concluir a sua missão e um "trabalho espinhoso pela frente", declarou hoje a sua presidente, Maria de Belém Roseira. Estão cada vez mais interessantes os tempos da política em Portugal. Maria de Belém vai ter certamente mais espinhos do que rosas nesta ingente demanda parlamentar. Com a legitimidade e, confesso, sobretudo muita curiosidade, de quem enquanto deputado teve uma também espinhosa missão de relatar em inquérito parlamentar estranhos negócios do Estado com outros bancos, acompanharei com muita atenção as vicissitudes desta empreitada. Sim, não me tomem por tolo: sei muito bem como funcionam os bastidores destas comissões. Mas agora há blogues.
Jaime Gama veio lembrar uma coisa que ninguém tinha percebido: é que os deputados são eleitos para comparecerem às reuniões. Os Presidentes são mesmo assim. Ainda bem que existem para fazerem o favor de nos iluminar as ideias. O que eu esperava é que Jaime Gama dissesse o que vai fazer para resolver o problema. Mas isso, resolver problemas, é coisa que todos acham que compete ao parceiro do lado fazer. No mínimo, o Presidente tem de garantir que não se instala a confusão geral na contabilização das presenças e das votações. Pode ser?
O PSD tem um deputado muito especial: Guilherme Silva. Eleito pelo círculo Alberto João Jardim, trabalha como advogado para o Governo Regional chefiado pelo mesmo Alberto João, fez de Alberto Martins de Durão Barroso e tem ideias luminosas. Para acabar com a pouca vergonha dos deputados baldas propõe extinguir a sessão parlamentar das sextas-feiras. E às segundas também não. Ou seja: fins de semana de quatro dias para os eleitos da Nação. Ora aí está o que se chama em politicaamente correcto uma mais valia, mas em português corrente uma chico espertice. O deputado ousou fazer de nós todos parvos. Eis outra virtude do mesmo deputado: a lata.
Segundo a lista de presenças na reunião plenária de sexta-feira publicada no sítio da Assembleia da República, só dez deputados faltaram ,"em missão parlamentar". Todos os outros estiveram presentes. Ora, como é fácil depreender do resultado das votações de sexta-feira, os deputados foram assinar e baldaram-se logo a seguir, não tendo obviamente tempo para participar nas votações. Nada de novo às sextas-feiras no Parlamento. São espectros, senhores, são espectros.
Um projecto do CDS-PP que defendia a suspensão do processo de avaliação dos professores poderia ter sido hoje aprovado na Assembleia da República, não fossem as ausências de alguns deputados da oposição. O PS acabou por chumbar as propostas que foram a votação, mas seis socialistas quebraram a disciplina de voto e manifestaram-se a favor de alguns projectos. Da oposição faltaram 35 deputados, 30 deles do PSD e dois do próprio partido que apresentou o projecto, sendo que do CDS outro deputado atrasou-se e não conseguiu chegar a tempo e horas para votar. A bolha continua a mexer e é tão grande, tão grande que até sobra para a oposição. Depois da bronca das votações na Páscoa, depois da falta de deputados para aprovar uma Lei Orgânica que deu brado aqui há uns anos, eis outro berbicacho parlamentar. Já sentíamos a falta.
A data de hoje ou, em alternativa, a de 5 de Outubro de 1143, devia ser solenemente comemorada pela Assembleia da República como os dias da independencia nacional. É verdadeiramente estranho que nenhum orgão de soberania, Tribunais obviamente à parte, não comemore de forma solene a independencia de Portugal.
Sei por experiencia própria que a Assembleia da República marca para o serão as audiências que pretende desvalorizar. É o caso de hoje, da audição com Vítor Constâncio. Aqui, o Banco decidiu contra-atacar com informação sobre os seus quadros afectos à supervisão. Mas o problema não é da quantidade, mas sim da qualidade.
Jaime Gama não aceitou o pedido de rectificação do Governo aos artigos que alteram a Lei de Financiamento dos Partidos, integrados na proposta de Orçamento do Estado para 2009. É uma titude de saudar que dignifica o Parlamento, numa conjuntura especialmente difícil para o efeito, como é o caso de eexistir uma maioria absoluta.
A ASAE não levantou o auto de contra-ordenação a José Sócrates por ter fumado no avião, apesar de segundo a ministra da Saúde competir à ASAE fazê-lo, mas a ASAE que tolera infrações legais do Primeiro-Ministro não as tolera à Assembleia da República. O refeitório do Parlamento vai fechar na sequência de recomendações feitas pela ASAE há dois anos. Ora aí está uma tolerância que todos os restaurantes gostariam de ter por parte da ASAE: dois anos para corrigir as deficiências detectadas. Mas não. Quando são particulares com falhas a ASAE fecha o estabelecimento e pronto. Ou seja: a ASAE é um festival de violações do artigo 13º da Constituição que diz que todos os cidadãos são iguais perante a lei.
Em que estado se encontra o célebre inquérito parlamentar à supervisão bancária que é suposto estar em curso no Parlamento?
O Presidente da República anda entretido com a falta de interesse dos jovens pela política. Não sei se já se terá dado conta que esta nova agenda lhe trouxe um enorme problema: o de ter também de se preocupar com a falta de interesse dos restantes portugueses, dos que não são jovens, pela política.
E matéria não falta para esse desinteresse.
Vi ontem na televisão um conjunto de deputados receberem na Assembleia da República o presidente de um clube de futebol que foi condenado na justiça desportiva e está neste momento a ser julgado, acusado da prática de crimes na justiça criminal. O presidente do clube, chegado, aliás, do tribunal, tinha um batalhão de jornalistas à espera, aos quais não ocorreram as perguntas elementares. O dirigente do futebol sorria, satisfeito, com o atestado de credibilidade institucional que aqueles deputados lhe estavam a passar.
Mas tenho de dizer que esses deputados não se deram ao respeito e, pior, arrastaram a Assembleia da República para o campo do descrédito.
Numa palavra: uma vergonha.
(publicado na edição de hoje do Democracia Liberal)
A Assembleia da República aprovou esta semana o Tratado de Lisboa. Depois de todos os partidos terem prometido um referendo, a verdade é que negaram aos portugueses o direito de se pronunciar directamente sobre o Tratado. Não é por não ser a primeira vez que deixa de ser uma vergonha.
O Tratado em si retira mais uma suculenta fatia de soberania ao Estado. E consolida uma Europa dos grandes Estados, subordinando os Estados mais pequenos à sua vontade e aos seus interesses.
Os portugueses continuam a ser tratados como capachos da vontade de um punhado de dirigentes submetidos a interesses estrangeiros, fazendo-o sem legitimidade, pondo assim em causa o mecanismo da representação política democrática.
(publicado na edição de hoje do Democracia Liberal)
Leio no Correio da Manhã de sábado que, a par de sites de droga e pornografia, a Assembleia da República mandou bloquear também o site da TV NET. Realmente é preciso topete. Alguém na AR não gosta da TV NET. Será por ser uma televisão independente?
Declaração de interesses: participo num programa da TV NET: o NETFIRE.
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