Sexta-feira, 1 de Maio de 2009

Os partidos do sistema, os que estão representados na Assembleia da República e se alimentam do Orçamento do Estado são cegos, surdos e mudos. Estão alheados do que se passa no país e do sentimento de desprezo, a caminhar para a repulsa, que a população começa a revelar sobre a sua forma de agir.

 

Num momento em que o combate à corrupção está na ordem do dia, os partidos não acharam melhor maneira de dar um sinal de empenhamento no combate à corrupção do que aumentar a possibilidade de circulação de dinheiro vivo nos seus cofres…

 

A nova lei do financiamento dos partidos políticos, das campanhas eleitorais e dos grupos parlamentares, que foi ontem aprovada na Assembleia da República, faz só isto: sobe em mais de um milhão de euros, de 22.500 para 1.257.660 euros, o limite das entradas em dinheiro vivo nos partidos. Mais de um milhão, leram bem, caros leitores. Dinheiro vivo, leram bem, caros leitores. Um aumento de mais de 55 vezes em relação aos limites actuais e que se aplica às quotas e contribuições dos militantes e ao produto das actividades de angariação de fundos. Por outras palavras, aplica-se aos Jacintos Leites Capelos Regos da vida.

 

De sublinhar que esta lei foi aprovada na especialidade e em votação final global em tempo recorde, mostrando assim que quando querem, pena é quererem poucas vezes, os deputados são capazes de legislar rápido e a tempo. A tempo, neste caso, é a tempo desses partidos terem os bolsos mais recheados a tempo das três campanhas eleitorais deste ano.

Esta é uma das maiores alterações à lei dos financiamentos políticos e que não constava do projecto de lei conjunto do PS e do PSD (o tal bloco central de que o presidente da CIP tanto gosta…), aprovado na generalidade em 13 de Dezembro de 2008. Quatro meses e meio depois, a discussão na especialidade foi toda feita numa manhã, em grupo de trabalho à porta fechada, onde também se realizou a votação indiciária. O texto final desta lei foi aprovado, na esmagadora maioria dos artigos, por unanimidade.


Esclareça-se que a alteração dos limites do dinheiro vivo foi introduzida como tentativa de satisfazer as pretensões do PCP, que pretendia alcançar 1,8 milhões de euros como tecto para a entrada de dinheiro vivo nos partidos e assim cobrir as quotas dos militantes sem conta bancária e grande parte das receitas obtidas na Festa do Avante!. Mas, a verdade é que não se tratou de uma cedência absoluta: o Governo já tinha deixado perceber a intenção de permitir a entrada de dinheiro vivo nos partidos ao introduzir, na lei do Orçamento do Estado, uma alínea que lhe abria a porta. Essa norma acabou por não passar na altura, por recusa da bancada socialista, que agora deu o seu aval às pretensões comunistas. O PS deixou entrar pela janela o que não deixou entrar pela porta.


Foi também pela necessidade de regularizar as contas da Festa do Avante! que o PCP, sempre preocupadíssimo com a degradação das condições de vida dos mais pobres e com as consequências da profunda crise económica e social que atinge “o nosso povo”, fruto das “políticas neo-liberais”, propôs ainda o aumento do tecto das angariações de fundos, através de iniciativas com oferta de bens e serviços, para 1,8 milhões de euros, o equivalente a 4000 IAS (Índice de Apoio Social, valor de referência para as subvenções públicas em substituição do salário mínimo nacional). Mais uma vez este valor foi revisto em baixa e fixado em 1,257 milhões de euros (3000 IAS), mesmo assim o dobro do actual limite de 675 mil euros (1500 SMN).


Outra originalidade destes partidos cegos, surdos e mudos foi preverem na nova lei os donativos de pessoas singulares às campanhas para as legislativas e europeias. Até agora isso só era possível nas eleições presidenciais e movimentos de cidadãos nas autárquicas. Neste caso, o limite é de 25 mil euros por doador, obrigatoriamente tituladas por cheque ou meio bancário que permita a identificação do valor e da origem. Uma norma que se aplicará assim que a lei entrar em vigor, o que os partidos esperam que aconteça mais uma vez, em tempo recorde, antes das eleições de 7 de Junho.


A nova lei aumenta ainda praticamente para o dobro (de 2500 SMN para 5000 IAS, quase um milhão de euros a mais) o limite máximo de despesas realizadas na segunda volta das eleições presidenciais. E reduz a metade o número de votos que um pequeno partido tem que obter para ter direito a receber subvenções públicas: em vez de 50 mil votos, bastando-lhes agora conseguir 25 mil votos. Esta alteração é muito positiva, embora, em rigor, não se compreenda a existência de um limite mínimo.


Segundo os relatos disponíveis na comunicação social, no final da votação-relâmpago, onde nem sequer houve tempo para a apreciação das propostas, todos os partidos usaram a palavra “transparência” para qualificar a nova versão de uma lei que, durante meses, apenas foi discutida nos gabinetes dos partidos.

 

Depois queixem-se…

(publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro)

 



publicado por Jorge Ferreira às 00:05 | link do post | comentar

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