Os tempos não estão para histórias nem para História. A crise do crédito que, em catarata se abateu sobre o mundo inteiro, puxa irresistivelmente a atenção de todos para as consequências da crise. Um pouco por todo o lado descobrem-se bancos falsos, fraudes financeiras de milhões, empresas a falir, desempregados a aumentar vertiginosamente, pobreza a alastrar. Especialmente em Portugal acresce um aumento preocupante da criminalidade, o recrudescimento das velhas suspeitas de corrupção à volta dos poderes, e um sem número de preocupações, nas quais, no meu caso, não entra, definitivamente, o penalty de Lucílio.
Aparentemente, pois, este será um texto deslocado no tempo e no espaço. Permito-me, desde já e antecipadamente, discordar. Creio que é nos momentos mais difíceis que os povos necessitam de reencontrar forças e energias no seu passado, na sua história, na sua identidade, como fonte de confiança para superar as dificuldades e olhar com mais serenidade o presente e o futuro.
Arrisco, por isso falar de duas histórias. Ou melhor de História, com agá grande.
A primeira história é esta: no próximo dia 26 de Abril de 2009 D. Nuno Álvares Pereira será canonizado. Esclareço que não sou nem especialista, nem militante da causa e dos ritos religiosos. Mas não confundo opções individuais com características do povo português e com traços essenciais da identidade e da cultura portuguesas. D. Nuno Álvares Pereira, além de herói da nossa história, passará a ser um herói e um exemplo da Igreja.
Sinceramente temo que este acontecimento, porque o é, indubitavelmente, passe ao lado da nossa tão bizarra agenda mediática e social. Em Portugal e
Até agora, não registei notícia de qualquer actividade, salvo referências de monárquicos (também não sou) e de membros da Igreja. Sucede que a Nação a que hoje gostamos de apelar deve a sua sobrevivência a muitos homens que, como D. Nuno Álvares Pereira se sacrificaram por ela. “Sacrificaram” vem de sacrifício, vocábulo entretanto caído em desuso de todas as áreas da vida comunitária. A noção de sacrifício para progredir, para trabalhar, para estudar, para lograr riqueza, é absolutamente estranha ao modo de vida moderno, em que se confia apenas na facilidade para ter tudo. Na facilidade de um sorteio, na facilidade de ser seleccionado para um big brother, na facilidade de encontrar professores que “dêem” notas independentemente do merecimento e dos conhecimentos que se mostrem ter. Mas, se na economia não existem almoços grátis, também na História não existem países grátis. Eles hão-de necessariamente ser o produto de muitas vontades, de muitos esforços e, inevitavelmente, de muitos sacrifícios.
Não duvido que qualquer país no nosso lugar faria da canonização de D. Nuno Álvares Pereira um acontecimento mediático de projecção mundial. Mesmo em plena crise e, se calhar, justamente por causa dela. Para aumentar a auto-estima colectiva e, pragmaticamente, para vender mundialmente o seu país e o seu produto histórico. Como nos disseram que aconteceu com o Euro 2004… Por cá, temo que nos fiquemos por uma coroa de flores na estátua que jaz junto ao mosteiro da Batalha, uns artiguitos de opinião sem dificuldade muito mais eruditos que este e uns posts nuns blogues mais desalinhados do main stream.
Tomar devia colocar-se, neste particular, no centro das atenções. Os poderes públicos e privados deviam celebrar a canonização de D. Nuno Álvares Pereira. Chamo a atenção, entretanto, para o facto de em 2008 se ter reatado uma tradição que parecia ter caído no esquecimento. Pela primeira vez em 35 anos foi celebrada missa campal por ocasião do 10 de Agosto junto à capela de S. Lourenço.
O Conselho Pastoral, dinamizado pelo sargento António Vasconcelos, em colaboração com o Regimento de Infantaria 15, de Tomar, decidiu voltar a assinalar o martírio de S. Lourenço e a junção dos exércitos de D. Nuno Álvares Pereira e do Mestre de Avis, antes de seguirem para a batalha de Aljubarrota. Ora, eis uma ligação de Tomar à gesta de D. Nuno Álvares Pereira que justifica acção e comemoração.
Já que não sou autarca, mas um simples cidadão anacronicamente interessado pelas pequenas coisas do meu país, gostaria de saber se a Câmara Municipal, a Junta de Freguesia de Sta. Maria dos Olivais, ou instituições privadas do concelho estão a pensar realizar alguma iniciativa relacionada com este acontecimento.
A segunda história é esta: em 2010, faz precisamente 850 anos que D. Gualdim Pais fundou a cidade de Tomar. Tudo o que fica dito sobre D. Nuno Álvares Pereira vale para este importantíssimo aniversário. Bem sei que os Templários, a Ordem de Cristo (essa malandragem que legou a Tomar pesada factura de atraso que ainda hoje se paga a prestações, assim como à Bragaparques…) e em geral o património e o seu profundo significado nesta terra, não está propriamente nas boas graças nem nas prioridades dos actuais responsáveis autárquicos. Mas esses responsáveis têm de perceber, ou alguém explicar-lhes de forma veemente, que não passam de transitórios e efémeros representantes de uma comunidade que já existia antes deles nascerem e existirá seguramente depois deles deixarem de representar o povo. Cumpre-lhes apenas estar à altura dos cargos (inocência persistente a minha neste particular…).
Bem sei que este ano há eleições e quem manda e quem quer mandar dá mostras de não ser capaz de pensar em mais nada senão na eleição, no poder, no lugarzinho, no penachito, nas medidas anti-crise, nas rotundas e, dizem-me, no metro de superfície! Mas, azar de calendário, passa-se que 2009 é também o ano de pensar e de programar uma dignificante comemoração do 850º aniversário da fundação de Tomar.
Resta, então, repetir-me: já que não sou autarca, mas simples cidadão anacronicamente interessado pelas pequenas coisas do meu país, gostaria de saber se a Câmara Municipal, as Juntas de Freguesia, ou instituições privadas do concelho estão a pensar realizar alguma iniciativa relacionada com este acontecimento. E o que dizem disto, se é que dizem, os candidatos à Câmara?
Mas também digo: se fôr para fazer umas coisitas rascas e pindéricas, como frequentemente acontece, de envergonhar qualquer um, mais vale estarem quietos. Não me apetece mesmo observar o comportamento habitual no nosso país quando se trata de comemorar os valores nacionais e os símbolos que ao longo dos tempos os vão ilustrando por obra humana. E não, não falo de dinheiro. Falo de dignidade nacional. Falo de poder nacional que os símbolos traduzem. Um povo que abdica desses valores, desses símbolos e de continuamente os projectar, local, nacional e internacionalmente, abdica de uma parcela estrutural do seu poder nacional, o mesmo é dizer, da justificação da sua independência enquanto Estado. Dirão alguns: e daí? E daí eu respondo: ide para alcaides de Ayuntamientos, ide …
(publicado n' O Templário)
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